Enquanto a imprensa vai atrás do caso do presente oficial que não é oficial, Arthur Lira fala grosso, como fez na palestra na Associação Comercial de São Paulo. Os recados do presidente da Câmara a Lula são importantes e dão o tamanho real do petista e do seu partido no contexto parlamentar.
Em primeiro lugar, Lula pode vociferar o quanto quiser sobre a independência do Banco Central e a reforma trabalhista, mas o Congresso não irá retroceder nessas conquistas importantes, segundo Arthur Lira. “Nós deveremos discutir avanços e não retrocessos com relação a reforma trabalhista, nós deveremos discutir a preservação de um Banco Central independente. Não tenham dúvidas disso! Esse ambiente de debates, de falas que não agregam, só pioram o ambiente da taxa de juros”, disse o presidente da Câmara.
“Temos um governo que foi eleito, muito embora com margem de voto mínima, que precisa entender que do último governo para hoje nós temos Banco Central independente, nós temos agências reguladoras, nós temos Lei das Estatais, nós temos um Congresso que hoje tem atribuição mais ampla.”
Em segundo lugar, se depender de Arthur Lira, Lula não terá facilidade para bancar o Robin Hood na questão dos impostos. Ao defender a reforma administrativa, ele abordou a reforma tributária, que será a possível:
“Nessa linha, nós temos uma reforma administrativa que está pronta para o plenário da Câmara dos Deputados e nós temos uma vontade conjunta do governo eleito, através de seu ministro da Economia, através de quem faz a parte econômica do governo, para tentarmos votar a reforma, tão falada, tão difícil, tão angustiante, que vai causar tantas discussões que é a reforma tributária.”
Em terceiro lugar, o arcabouço fiscal que está sendo montado (às pressas) por Fernando Haddad não poderá conter barbaridades fiscais (além das já existentes e precificadas). Disse Lira:
“Os líderes se reuniram na Residência Oficial e foi feito um acordo de que esse texto do arcabouço fiscal vai ter que vir médio, prudente, responsável, equilibrado.”
Por fim, na questão especificamente política, o presidente da Câmara foi claro sobre os limites de Lula e do PT:
“Nós teremos um tempo para que o governo se estabilize internamente. Porque, hoje, o governo ainda não tem uma base consistente nem na Câmara, nem no Senado, para enfrentar matérias de maioria simples, quanto mais matéria de quórum constitucional.”
A fala de Arthur Lira calou fundo entre os petistas. Jaques Wagner, líder do governo no Senado, respondeu pela imprensa. “Essa é uma opinião dele, eu respeito como presidente da Casa, mas na hora que a gente for votar uma matéria é que a gente vai conferir. A gente tem aqui no Senado uma coisa consolidada, não vejo problema aqui”, disse o líder do governo no Senado. Jaques Wagner acrescentou: “Na minha conta, são mais de 50 senadores na base. Mas o que estou falando é que tudo depende da matéria. Pode ter até alguém do PT, em determinada matéria, por uma questão de consciência, votar assim ou assado… É difícil. Essa linearidade não existe.”
A resposta de Jaques Wagner só fez confirmar o que disse Arthur Lira.
Quando afirma que o Congresso, hoje, tem “atribuição mais ampla”, o presidente da Câmara quer dizer que, por causa do orçamento secreto institucionalizado pela resolução aprovada em dezembro, os parlamentares do Centrão dependem menos da caneta presidencial para conseguir dinheiro — e, assim, estão ainda mais livres para dificultar a vida do inquilino do Palácio do Planalto nas votações, bem como para impor nomes nos ministérios, em troca de apoio.
Para não falar que o atual governo “foi eleito, muito embora com margem de voto mínima”, como frisou Arthur Lira.
Ou seja, dito de outra forma, Lula é um presidente que teve quase a metade dos eleitores contra ele e, portanto, não é o mesmo Lula dos mandatos anteriores. A manutenção de Juscelino Filho nas Comunicações se dá neste contexto. Aliás, os recados do presidente da Câmara foram dados horas antes de Lula reunir-se com o Pégaso da Esplanada.
Tudo em Brasília é questão de preço, mas, no quadro atual, pode ser que, já satisfeitos com o muito que têm, deputados e senadores se recusem a deixar que o país pague a conta imensamente maior dos desvarios que habitam a cachola de Lula. É a outra face do Centrão.
Fonte: Metrópoles – Mário Sabino