Doses são suficientes, mas vacina atrasada obriga seleção de grupos prioritários

O Plano Nacional de Imunização (PNI), lançado na semana passada pelo governo federal, prevê a compra de 350 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19 para 2021.

Essa quantidade, de acordo com o texto, seria suficiente para vacinar cerca de 175 milhões de pessoas, dentre os mais de 210 milhões de brasileiros, considerando que a imunização deve exigir duas aplicações em cada pessoa – e que há uma pequena perda, esperada, de doses nos frascos.

Veja abaixo, em detalhes, o que o PNI prevê sobre a aquisição de vacinas contra o novo coronavírus:

AstraZeneca e Universidade de Oxford, em parceria com Fiocruz
• 100,4 milhões de doses até julho de 2021, a partir de ingrediente farmacêutico ativo (IFA) importado
• 110 milhões de doses entre agosto e dezembro de 2021, fabricadas nacionalmente (com o IFA produzido na Fiocruz)
Total: 210,4 milhões de doses

Covax Facility (consórcio Acesso Global de Vacinas Covid-19, da OMS)
• 42,5 milhões de doses (cronograma de entrega ainda está em negociação).

Pfizer, em parceria com a BioNTech*
• 8,5 milhões até junho de 2021
• 32 milhões no terceiro trimestre
• 29,5 milhões no quarto trimestre
Total: 70 milhões de doses

Janssen (Johnson & Johnson)* 
• 3 milhões no segundo trimestre de 2021
• 8 milhões no terceiro trimestre de 2021
• 27 milhões no quarto trimestre de 2021
Total: 38 milhões de doses

* Memorandos de entendimento (intenção de acordo)

Além disso, considerando também os acordos fechados por governos estaduais com laboratórios, o Brasil poderia chegar a 446 milhões de doses de imunizantes previstas (veja os números abaixo), suficientes para vacinar todos os 211 milhões de habitantes ao menos em uma rodada de campanha – com duas doses por pessoa.

Coronavac (Sinovac em parceria com o Instituto Butantan) – São Paulo
• 120 mil doses – recebidas em novembro
• 600 litros de insumos, suficientes para produzir 1 milhão de doses – recebidos em dezembro
• 2 milhões de doses – recebidas em novembro
Total entregue: 3,12 milhões de doses
Total acordado: 46 milhões

Sputnik V (Instituto Gamaleya em parceria com o Fundo Russo de Investimento Direto – RDIF) – Bahia
• 50 milhões de doses

Apesar de, em teoria, isso significar que o PNI prevê a compra de doses para imunizar cerca de 83% da população, há um desafio implícito nesses números: as doses não vão chegar todas de uma vez, o que pode obrigar o governo a tomar decisões sobre aqueles que, mesmo dentro dos grupos prioritários, serão imunizados primeiro.

“Nós pedimos tarde [as vacinas], assinamos os contratos de intenção de compra com alguns laboratórios, como a Pfizer-BioNTech, muito depois de outros países”, disse à CNN Mônica Levi, diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e presidente da Comissão de Revisão de Calendários Vacinais da SBIm.

“Só na primeira fase de vacinação são 15 milhões de pessoas, que demandam mais de 30 milhões de doses. A própria Pfizer prevê a entrega de 8,5 milhões de doses no primeiro trimestre de 2021, então vamos precisar de todas as vacinas que forem aprovadas pela Anvisa, seja de Oxford, seja a Coronavac ou qualquer outra, mas que também não chegarão de uma vez.”

Considerando o público-alvo das três primeiras fases de vacinação, o PNI estima que o país precisaria de ao menos 104 milhões de doses.

“Alguns desses acordos, como o da AstraZeneca/Oxford com a Fiocruz e da Sinovac com o Butantan, envolvem a transferência tecnológica, então a complementação de doses necessárias poderá ser produzida nacionalmente por esses laboratórios”, ressaltou a especialista.

Ela observa que, em teoria, se o Butantan conseguir mesmo produzir 1 milhão de doses por dia, somado à capacidade da Fiocruz – que ainda não foi divulgada – o país pode se tornar autossuficiente na produção da vacina contra a Covid-19.

“Poderíamos ter mais de 350 milhões de doses por ano só com o Butantan, ampliando muito com a produção da Fiocruz, chegando em algum momento a termos capacidade até para exportar, como acontece hoje com a vacina da febre amarela”, afirmou Levi.

Desigualdade

Enquanto o Brasil teria um volume para imunizar a população uma vez, os países mais ricos do mundo vêm estocando imunizantes e, hoje, conseguiriam vacinar três vezes as suas populações.

Recentemente, o People’s Vaccine Alliance, que monitora as vacinas e atua em colaboração com grupos como Anistia Internacional e Oxfam, fez um alerta para isso e destacou que algumas nações em desenvolvimento estão sendo deixadas para trás na corrida global pelo fim da pandemia.

Segundo o grupo, nas 67 nações do mundo consideradas pobres, apenas 1 em cada 10 pessoas pode esperar receber uma vacina até o final de 2021. Enquanto isso, os países desenvolvidos já acumulam um excedente do produto: os que representam apenas 14% da população mundial já compraram mais da metade das doses de vacinas mais promissoras em desenvolvimento atualmente.

Fonte: CNN Brasil