Migração de brasileiros para EUA via México aumenta 6,5 vezes em um ano

Há seis meses, a porteira Sabrina Maria dos Santos Gonçalves, 42, espera todos os dias por notícias da filha, a operadora de telemarketing Raiane Samira dos Santos, 23, que desapareceu com o marido, Daniel Mourão Almeida, 31, ao tentar atravessar a fronteira do México com os Estados Unidos. “A gente ainda tem esperanças de receber uma ligação dela”, diz Sabrina à CNN.

O último contato do casal com a família foi no dia 12 de março, quando os dois fizeram uma chamada de vídeo de um hotel da cidade mexicana de Tijuana. A ligação foi pouco antes que eles pegassem um barco, com outras oito pessoas, para cruzar a fronteira durante a noite. “Eu já perdi uns 15 kg desde esse dia. A gente só quer uma resposta”, afirma a mãe, que mora em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo.

Daniel e Raiane não foram os únicos brasileiros a se arriscar na travessia do México para os Estados Unidos neste ano. No último dia 15, agentes encontraram o corpo da técnica de enfermagem Lenilda dos Santos, 49, no deserto de Deming, no estado norte-americano do Novo México. Proveniente de Rondônia, ela morreu ao ser abandonada, sem água e comida, pelo grupo que cruzava para os Estados Unidos a pé.

Na semana passada, brasileiros foram encontrados na boleia de um caminhão ao lado de imigrantes do Equador, El Salvador, Honduras, Guatemala, México e Peru. Ao todo, 49 pessoas foram detidas na região de Sierra Blanca, no Texas.

Mais de 46 mil brasileiros deportados

A Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA (US Customs and Border Protection) informou à CNN que o número de brasileiros que tentaram entrar de forma ilegal no país cresceu 6,5 vezes no último ano. Entre outubro de 2020 e setembro de 2021, 46.410 imigrantes do Brasil foram deportados contra 7.161 no período anterior.

A maioria dos brasileiros tentou entrar pelas fronteiras do Arizona (28.538) e da Califórnia (14.266). Mais da metade viajava em família (34.636) e há registro de cinco menores detidos pela imigração.

“O aumento de deportações, não apenas de brasileiros, é reflexo de uma combinação de vários fatores. Muitas pessoas pensaram que, depois do governo [de Donald] Trump, ficaria mais fácil cruzar a fronteira e pedir asilo, o que não aconteceu”, explica Jason De León, presidente do Colibrí Center for Human Rights, uma organização que atua na busca pelos desaparecidos na região.

Na semana passada, o governo de Joe Biden realizou a deportação em massa de milhares de haitianos que tentavam atrasar para os Estados Unidos. “Muitos imigrantes chegam fugindo da violência, de eventos climáticos e por conta das consequências da pandemia de Covid-19, que teve impactos sanitários e econômicos”, afirma De León.

Sonho americano

Daniel e Raiane tentaram entrar legalmente nos Estados Unidos, mas tiveram o visto negado duas vezes pelas autoridades do país. Foi aí que decidiram pagar coiotes (bandidos que providenciam a travessia ilegal) para cruzar a fronteira pelo México. “Eles queriam trabalhar, ter uma vida melhor. Venderam tudo o que tinham e pediram demissão”, conta a mãe.

Em Ribeirão Preto, Raiane era operadora de telemarketing e Daniel trabalhava em uma distribuidora de óleos lubrificantes. Cada um pagaria cerca de R$ 100 mil para os coiotes pela viagem.

Em São Paulo, os dois embarcaram em um voo para a Cidade do México, onde chegaram no dia 11 de fevereiro. De lá, pegaram um avião para Ensenada, no estado mexicano da Baixa Califórnia. Ali, foram recebidos por coiotes que os levaram de carro até Tijuana, cidade a 100 km de distância, já na fronteira com os Estados Unidos.

O plano era atravessar, pelo mar, para San Diego, já nos Estados Unidos, e de lá viajar até o estado de Massachusetts, onde Daniel tem familiares. “Eles passaram um mês em Tijuana, tentaram atravessar três vezes, mas em todas elas precisaram voltar. Uma vez o barco quebrou, outra eles estavam sem rádio de comunicação e, na terceira, apareceram drones da polícia”, conta Sabrina.

Na quarta tentativa, ligaram para a família às 4h37 para avisar que o fariam outra vez. No Brasil, Sabrina ouviu a voz ansiosa da filha e desejou boa sorte para os dois. Acordou no meio da noite, fez suas orações e, sem notícias, chegou a pensar que tinha dado tudo certo.

Fonte: CNN Brasil