Arthur Lira (PP/AL) quer colocar em votação ainda hoje requerimento de urgência para a votação do projeto de lei 2630/20, o PL das Fake News. Caso aprovado, o texto será apreciado diretamente no plenário da Câmara sem passar pelas comissões temáticas — provavelmente amanhã. É um atropelo ao rito legislativo e ao debate democrático. Na prática, o deputado alagoano quer censurar o debate sobre a censura. Não poderia ser mais acintoso.
O tema é espinhoso e resvala na liberdade de expressão, um valor constitucional (ainda). Não se pode obliterar o diálogo com o argumento covarde de se combater ‘desinformação e discurso de ódio’. Afinal, quem define o que é desinformação e discurso de ódio? Segundo o texto, uma tal ‘entidade autônoma de supervisão’ a ser criada. Frisa-se que o texto que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet é de difícil execução, pois impõe às plataformas a responsabilidade de moderação de todo conteúdo.
Repisa leis que já existem, incorporando ao ambiente virtual artigos dos código penal e civil, do estatuto da infância, da lei antiterror e até da Constituição. Não faz o menor sentido, considerando que nossa existência nos dias de hoje, interações sociais, o debate político e atividades comerciais, entre outras, se dão no ambiente digital — que nada mais é do que uma extensão do que vivemos fora dele. Concordo com a opinião de especialistas de que bastaria, na verdade, uma meia dúzia de artigos para resolver a questão. Por exemplo, impedindo o anonimato nas redes com a certificação digital associada a cada CPF e CNPJ.
Todos sabemos que essas plataformas rentabilizam seu negócio por meio do tráfego e que seus algoritmos impulsionam conteúdos que geram polarização, a velha treta que também anima o expectador na TV e no rádio, que vende notícia em sites e jornais. Mas em todos os veículos de comunicação tradicionais, as pessoas são reais e colocam sua cara e CPF. Respondem pelo que falam, inclusive na Justiça. Não faz sentido que políticos, empresários, jornalistas, médicos e outros tantos profissionais escrevam, comentem e dialoguem nas redes ao lado de perfis anônimos, de haters escondidos atrás de emojis, de avatar de pet ou de heróis da Marvel.
Com o fim do anonimato, certamente 70% do problema estaria resolvido.
Lira diz que “há uma narrativa falsa, de grandes plataformas, de que a população terá intervenção na sua internet” e que que seu objetivo “garantir, na formalidade da lei, os direitos para que uma rede funcione para o que ela deve, e não para situações como, por exemplo, essa questão das escolas”. “Há de se ter um limite para isso, garantido a todos a sua liberdade de expressão, e cada um a arca com as consequências do que fala nas redes”, afirma. Se o deputado realmente acredita nisso, deveria ouvir mais a sociedade e garantir o amplo debate legislativo, sem atropelos.
Fonte: Jovem Pan News – Claudio Dantas